5.3.05

CARTA A SOFIA




Sabes, és um sol.
Pelo amor de que quem talvêz nunca te venha a conhecer,
o teu nascer foi pressentido no mais fundo sentir de uma noite.
Do grito que que te anunciou, irradiou a luz e o mistério de cada amanhecer na savana africana.
E desse grito transpirarm gotas de saudade da terra donde vens e de onde serás eternamente.
Porque as raízes do embondeiro não se arrancam, mesmo depois do corpo secar.

Vais ser amada como ninguem. Porque tens ao teu redor, o amor repartido nas noites á fogueira.
O amor partilhado pelos corpos e as almas, sem amarras ou correntes.
Porque te ensinarão que na vida, apenas compensa amar o que é verdadeiro.

Um dia irás comprovar e sentir que és diferente.
Porque no teu sangue, correm séculos de luta pela dignidade e sobrevivência, correm milhares de anos de paixão pelo que é simples, correm rios de admiração e respeito pela natureza.

De tudo isso, aqueles que te rodeiam te irão falar.
Abrirás os olhos de espanto ao ouvir as histórias maravilhosas da avó branca de coração negro.
Ela moldará com o seu amor por ti, a tua vida.
Da sua boca, com a paixão que só ela sabe sentir, sairá o som do batuque quente, as imagens unicas dos corpos negros possuídos, o mistério da sobrevivência dura mas feliz de toda um continente.

Sentada no seu colo, viverás histórias tão fantásticas, como aquela do rio que beija carinhosamente a montanha, para assim poder deitar-se nela… e depois cair nos braços da planicie.
Viverás histórias verdadeiras de florestas misteriosas em que habitam todos os duendes bons.
Viajarás sentada numa gazela pelas savanas imensas.
Sentirás na sua vóz os cheiros da terra negra pela manhã com cacimbo e aprenderás a amar a vida com a sabedoria ancestral e simples dos velhos.

Será este o teu tesouro…, a vida ensinada da terra.
Filha amada de sangue negro, nunca renegues esse amor.. nasceste dele e com ele.


Bem vinda…. filha de África.



Maputo, 21 de Setembro de 2002