Mãe, hoje foi um dia triste. Hoje um amigo morreu. De malária parece. Aqui morre-se de tanta coisa. Morreu, lá longe aqui de Maputo, nas minhas terras de Cabo Delgado onde deixei tanto suor ao longo de 4 anos de trabalho. Tinha mulher e 3 filhos aqui, dois parece que ainda crianças. Por aí, deixou á mais de 20 anos uns tantos filhos e possivelmente uma mulher á espera. Hoje, já ninguem se deve lembrar dele nem ele se preocupava com isso. Nenhum de nós os amigos sabe sequer de onde era natural ou tem um contacto para informar da sua morte. Tambem não deve fazer grande diferença. Era um resistente daqueles que lhes bastou chegar e respirar o ar desta terra para de imediato decidir nunca mais voltar. Mudou de pátria á mais de 20 anos. Agora vai ser comido pela terra de Maputo. Para isso vai ser necessário um camião de dinheiro para trazer o corpo de quase 2.000 kms. Dinheiro que a familia não tem e nós os amigos estamos a tentar juntar. Nem sei porque nos vamos dar a este esforco. No fundo ficar lá sepultado por Cabo Delgado ou em Maputo seria igual. A terra que o vai comer é a mesma e a ele tanto lhe faz, agora.
Hoje tambem, outro amigo foi hospitalizado porque teve uma hemoragia e o sangue não parava de sair do nariz. Entrou numa clinica onde até a folha onde imprimem a factura se paga caro e a primeira coisa que perguntam quando se entra, mesmo que meio morto, é se tem dinheiro vivo ou cartão crédito. Foi operado duas vezes e está todo ligado com uns tubos que não o deixam comer ou falar. Aqui tem mulher e duas filhas crianças. Ai, mais dois filhos que não vê desde que saiu, porque nunca mais voltou. Não vai morrer desta por certo, tambem é um resistente pois anda por cá a batalhar á mais de 10 anos e não me parece que tenha algum dia posto a hipótese de voltar. Agora, saia daquele hospital recuperado ou morto está lá uma conta por pagar que deve corresponder a mais de 1 ano de salário. A familia não tem o dinheiro e nós os amigos estamos a tentar ajudar. Mais uma vez.
Mas mãe, o que eu queria verdadeiramente dizer-te é que eu tambem sou um resistente como sabes mas hoje pus-me a pensar que possívelmente não sou tanto como pensava. Tenho por cá uma vida, alguns amigos importantes, uma mulher em casa, uma filha linda que ainda não conheces e muitas noites mal dormidas por causa de tudo e mais aquilo que tu sabes porque me conheces melhor que ninguem. Deixei aí dois filhos que amo muito, uma mulher que cansou de esperar, o pai, os manos, os sobrinhos e a ti. E podes crer que ao longo destes anos todos, não acabou um unico dia em que não sinta saudades de todos vocês e que não me pergunte a mim mesmo porque troquei tanta coisa importante por esta vida errante.
Mãe, hoje senti muito a falta de tudo o que não fui e arrependimento pelo que sou. Senti muita vontade de estar ai ao pé de ti. Queria muito abraçar-te como faziamos quando eu ainda não tinha cometido tantos erros e sentia muito menos duvidas. E queria conseguir perceber, que raio de feitiço obriga tanta gente a vir de tão longe e nunca mais querer sair desta terra, tal como me aconteceu a mim. Termino com um pedido simples mas muito importante. Por favor mãe. Não partas de surpresa sem que eu nao esteja bem perto de ti, sem ter tempo de te dizer nos olhos o quanto te amo e o muito importante que és ainda hoje para mim. E não deixes o pai partir tambem. Cuida dele como tens cuidado de mim sempre. Esperem por mim porque em cada dia que passa, em cada desgosto que me abala, sinto estas amarras a soltarem-se.
Hoje tambem, outro amigo foi hospitalizado porque teve uma hemoragia e o sangue não parava de sair do nariz. Entrou numa clinica onde até a folha onde imprimem a factura se paga caro e a primeira coisa que perguntam quando se entra, mesmo que meio morto, é se tem dinheiro vivo ou cartão crédito. Foi operado duas vezes e está todo ligado com uns tubos que não o deixam comer ou falar. Aqui tem mulher e duas filhas crianças. Ai, mais dois filhos que não vê desde que saiu, porque nunca mais voltou. Não vai morrer desta por certo, tambem é um resistente pois anda por cá a batalhar á mais de 10 anos e não me parece que tenha algum dia posto a hipótese de voltar. Agora, saia daquele hospital recuperado ou morto está lá uma conta por pagar que deve corresponder a mais de 1 ano de salário. A familia não tem o dinheiro e nós os amigos estamos a tentar ajudar. Mais uma vez.
Mas mãe, o que eu queria verdadeiramente dizer-te é que eu tambem sou um resistente como sabes mas hoje pus-me a pensar que possívelmente não sou tanto como pensava. Tenho por cá uma vida, alguns amigos importantes, uma mulher em casa, uma filha linda que ainda não conheces e muitas noites mal dormidas por causa de tudo e mais aquilo que tu sabes porque me conheces melhor que ninguem. Deixei aí dois filhos que amo muito, uma mulher que cansou de esperar, o pai, os manos, os sobrinhos e a ti. E podes crer que ao longo destes anos todos, não acabou um unico dia em que não sinta saudades de todos vocês e que não me pergunte a mim mesmo porque troquei tanta coisa importante por esta vida errante.
Mãe, hoje senti muito a falta de tudo o que não fui e arrependimento pelo que sou. Senti muita vontade de estar ai ao pé de ti. Queria muito abraçar-te como faziamos quando eu ainda não tinha cometido tantos erros e sentia muito menos duvidas. E queria conseguir perceber, que raio de feitiço obriga tanta gente a vir de tão longe e nunca mais querer sair desta terra, tal como me aconteceu a mim. Termino com um pedido simples mas muito importante. Por favor mãe. Não partas de surpresa sem que eu nao esteja bem perto de ti, sem ter tempo de te dizer nos olhos o quanto te amo e o muito importante que és ainda hoje para mim. E não deixes o pai partir tambem. Cuida dele como tens cuidado de mim sempre. Esperem por mim porque em cada dia que passa, em cada desgosto que me abala, sinto estas amarras a soltarem-se.
Eu sei que vou voltar.