20.1.09

A little less conversation a little more action (short fiction story of a prelude to a New York kiss)


(Existem blogues maus e blogues bons. Este é entre os bons um dos melhores. Com a devida vénia ao Hugo Gonçalves). (falta o som original mas tambem não se pode copiar tudo)


Ela disse-lhe: 'You make wrinkled shirts look cool'.


Ele tinha uma nódoa de rum cola junto ao colarinho - alguém o empurrara num alcoolizado momento de dança, os dedos ficaram molhados, depois pegajosos, açúcar que ele lambeu baixando a cabeça como um miúdo que acabou de cometer uma ilegalidade na cozinha. Ele disse: 'I don't smoke, but do you have a cigarette?'
Ela aproximou-se mais. Tinha o cabelo ruivo, os olhos azuis, dedos com manchas de tinta. Ele tirou mais pedras de gelo do balde em cima da mesa. Disse: 'So you're an artist?' Ela tirou-lhe o copo da mão, provou, serviu mais rum: 'Boys need to be boys'.
Ele bebeu. O fervor do excesso de álcool espalhou-se nas paredes da boca e por todo o sistema nervoso. Olhou para o vestido dela, os ombros sem tecido, uma veia azul no pescoço quando ela se ria. E ria-se tanto. Ela perguntou: 'Nina Simone or Billie Holyday?'
Ele aproximou-se, as ancas de ambos a menos de um dedo de distância, uma das mãos segurando o copo, a outra a pousar no vestido, um pouco abaixo das costelas, até que o polegar deslizou, apertando-lhe o ponto onde se estreia a virilha. Por cima do vestido, ele podia sentir o fino elástico que lhe rodeava a cintura. Ela disse-lhe, boca ao lado da boca: 'It's like you're undressing me already.'
Cruzaram a festa, ela parou para conseguir um copo de água, gelo, limão. Ele agarrou um cubo de melancia que se transformou em sumo dentro da boca. Havia fumo, e fila para a casa de banho, e pessoas que tinham chegado da praia. Duas irmãs de bikini bebiam margueritas. Um ilustrador sóbrio falava com um diplomata ganzado. No corredor, onde a corrente de ar apagara as velas no chão, alguém mordia o pescoço de alguém.
Subiram para o terraço do prédio: um sofá, antenas de televisão, as pontes sonoras e iluminadas sobre o East River.
Ela inclinou-se no parapeito do terraço, virou-lhe as costas, disse: 'I think I've never made out with anyone in Brooklyn.' E bebeu a água, limpou a língua, estilhaçou uma pedra de gelo dentro da boca, produziu saliva com sabor a limão.
Ele disse-lhe: 'Water melon tongue', e a sua mão pressionou-lhe a curva onde as costas se despistam, puxou-a para si, a outra mão segurou-lhe a cara, o dedos entraram no cabelo, agarrou-a com mais força, e ela afastou as pernas, roçou a pele das coxas nas calças de ganga, o centro do seu corpo cedeu, um ombro inclinou-se, os lábios cresceram, a sua boca podia ter dito: 'Do something to me'.
Ele virou-a de costas e apanhou-lhe o cabelo na nuca com uma das mãos: firme, sem espaço de manobra. Com a outra mão desceu-lhe uma alça do vestido, usou um dedo para contornar a curva do ombro, descer pelo peito, sobrevoar o mamilo. Mordeu-lhe o pescoço, os músculos da nuca, deixou a marca dos dentes.
Ela disse: 'Do it already', e rodou sobre si mesma, a alça a meio do antebraço, a boca apontada, a urgência de ficar sem fôlego.
E depois beijaram-se.

19.1.09

Tarde, quase sempre....


Entras-me no pensamento enquanto olho o fumo do cigarro que sobe ao longo dum ténue raio de luz e se desfaz na penumbra da sala. Chegas acompanhada daquele perfume forte que te sai dos poros e que, como um fantasma de estimação me persegue para todo o lado com o unico objectivo de me recordar de ti e complicar ainda mais a vida. E, como sempre, reprimo a vontade de pegar no telefone e te gritar aos ouvidos o desejo necessário e urgente que me invade o corpo á tempo demais. Sei-te livre e disponivel. Mas não consigo confessar-te por palavras que sei exatamente a que cheira o teu corpo transpirado quando solitária deixas correr as mãos e os dedos pela pele quente. Porque não encontro forma de justificar a razão de te comparar com cada uma daquelas que me partilham e que quase nunca deixam mais que a breve intensidade de um extase. E sobretudo como não ser vulgar ao confessar-te que te desejo mais que qualquer outra, mesmo aquelas que conheces e a quem criticas por eventualmente terem “caído na minha teia”, como afirmas segura e certa de que contigo nunca seria assim.
Aprisiono a vóz mas não o calor que me amarra ás memórias daquilo que nunca tive e provávelmente nunca terei. Desculpo-me na tua incapacidade para me perceber teu prisioneiro sem que seja necessário dizer-to na cara. Não me atrevo sequer pensar que a distancia de ti a que me obrigas, é apenas e só, a tua forma de me sentir. E na minha incapacidade para te demonstrar que apesar de assim estarmos socialmente livres da má lingua costumeira, o nosso unico lugar compensador era socializarmo-nos um no corpo do outro.
O fumo do cigarro á muito desapareceu engolido pela pouca pela luz que passa atravéz do cortinado. Fica o teu perfume a pairar na sala vazia onde vagueia intruso, o teu fantasma. E a absoluta certeza que comecei a adiar-me no dia em que te conheci.