30.4.07

Ligeira.. ligeirinha!!!


Ontem, enquanto empurrava o baloiço da Sininho num jardim público da cidade, dei comigo a pensar que nos ultimos tempos, para alem dela, foste a ultima pessoa verdadeiramente importante que disse que me amava. E a memoria surgiu porque foi naquele local que á uns tempos atrás, durante uma manhã de domingo, passei mais de uma hora a segurar o triciclo com uma mão e com a outra a manter o celular colado ao ouvido enquanto tentava em vão, secar-te mais uma torrente de lágrimas daquelas que adoras carpir depois de mais uma noite de espera inglória por alguem.

Hoje recebi de ti um email teu em que falas um tal blogue que te leva a recordar-me ou ouvir-me cada vez que o frequentas.
Já a ti, sinto-te a cada dia mais próxima. Não no teu blogue meio abandonado, mas impondo o ritmo do triciclo ou do baloiço ou ainda naquela forma cada vez mais desconcertante e incisiva dela questionar tudo e quantos a rodeiam. Tanto quis que ali estivesse a tua marca, que aos poucos ela se está a instalar mesmo contigo longe.

23.4.07

Msg SMS



Recorda-te de nós. Não creio que seja dificil lá para onde vais, encontrares um pouco da nossa historia e é o minimo que te posso pedir. Afinal não se vive impunemente um amor como o nosso e se sai incólume como se nada se tivesse passado. E depois espero que essas breves recordações não atrapalhem aquilo que dizes ser o principal objectivo desta tua definitiva ausência. A busca de ti mesma. Demora o tempo necessário e quando encontrares, volta para levar o teu coração que teimosamente recusou entrar na mala permanecendo aqui colado a mim. Só assim seremos verdadeiramente livres um do outro.

15.4.07

Carta


Mãe, hoje foi um dia triste. Hoje um amigo morreu. De malária parece. Aqui morre-se de tanta coisa. Morreu, lá longe aqui de Maputo, nas minhas terras de Cabo Delgado onde deixei tanto suor ao longo de 4 anos de trabalho. Tinha mulher e 3 filhos aqui, dois parece que ainda crianças. Por aí, deixou á mais de 20 anos uns tantos filhos e possivelmente uma mulher á espera. Hoje, já ninguem se deve lembrar dele nem ele se preocupava com isso. Nenhum de nós os amigos sabe sequer de onde era natural ou tem um contacto para informar da sua morte. Tambem não deve fazer grande diferença. Era um resistente daqueles que lhes bastou chegar e respirar o ar desta terra para de imediato decidir nunca mais voltar. Mudou de pátria á mais de 20 anos. Agora vai ser comido pela terra de Maputo. Para isso vai ser necessário um camião de dinheiro para trazer o corpo de quase 2.000 kms. Dinheiro que a familia não tem e nós os amigos estamos a tentar juntar. Nem sei porque nos vamos dar a este esforco. No fundo ficar lá sepultado por Cabo Delgado ou em Maputo seria igual. A terra que o vai comer é a mesma e a ele tanto lhe faz, agora.

Hoje tambem, outro amigo foi hospitalizado porque teve uma hemoragia e o sangue não parava de sair do nariz. Entrou numa clinica onde até a folha onde imprimem a factura se paga caro e a primeira coisa que perguntam quando se entra, mesmo que meio morto, é se tem dinheiro vivo ou cartão crédito. Foi operado duas vezes e está todo ligado com uns tubos que não o deixam comer ou falar. Aqui tem mulher e duas filhas crianças. Ai, mais dois filhos que não vê desde que saiu, porque nunca mais voltou. Não vai morrer desta por certo, tambem é um resistente pois anda por cá a batalhar á mais de 10 anos e não me parece que tenha algum dia posto a hipótese de voltar. Agora, saia daquele hospital recuperado ou morto está lá uma conta por pagar que deve corresponder a mais de 1 ano de salário. A familia não tem o dinheiro e nós os amigos estamos a tentar ajudar. Mais uma vez.

Mas mãe, o que eu queria verdadeiramente dizer-te é que eu tambem sou um resistente como sabes mas hoje pus-me a pensar que possívelmente não sou tanto como pensava. Tenho por cá uma vida, alguns amigos importantes, uma mulher em casa, uma filha linda que ainda não conheces e muitas noites mal dormidas por causa de tudo e mais aquilo que tu sabes porque me conheces melhor que ninguem. Deixei aí dois filhos que amo muito, uma mulher que cansou de esperar, o pai, os manos, os sobrinhos e a ti. E podes crer que ao longo destes anos todos, não acabou um unico dia em que não sinta saudades de todos vocês e que não me pergunte a mim mesmo porque troquei tanta coisa importante por esta vida errante.

Mãe, hoje senti muito a falta de tudo o que não fui e arrependimento pelo que sou. Senti muita vontade de estar ai ao pé de ti. Queria muito abraçar-te como faziamos quando eu ainda não tinha cometido tantos erros e sentia muito menos duvidas. E queria conseguir perceber, que raio de feitiço obriga tanta gente a vir de tão longe e nunca mais querer sair desta terra, tal como me aconteceu a mim.
Termino com um pedido simples mas muito importante. Por favor mãe. Não partas de surpresa sem que eu nao esteja bem perto de ti, sem ter tempo de te dizer nos olhos o quanto te amo e o muito importante que és ainda hoje para mim. E não deixes o pai partir tambem. Cuida dele como tens cuidado de mim sempre. Esperem por mim porque em cada dia que passa, em cada desgosto que me abala, sinto estas amarras a soltarem-se.
Eu sei que vou voltar.

11.4.07

Noites de Maputo I


O alcool corria pelas gargantas quase com a mesma intensidade do som que saía das colunas. Muita. Corpos frenéticos agitavam-se na pista de dança, eles e elas fazendo daquele ritual um evidente acto pré-acasalamento. Outros eles e elas, voando em lugares bem longe dali, palpebras semi-cerradas, escoando mentalmente os efeitos de algum analgésico adquirido de certeza por engano, ao dealer de serviço. Outras e outros preferiam o pouco comodo balcão onde recostavam o corpo em evidente posição de espionagem não fosse passar-se algo na sala que escapasse ao seu olhar prespicaz e lingua viperina.
A noite ameaçava transformar-se em madrugada e aos poucos a fauna ia rumando a outras paragens, apesar de a casa estar ainda meio cheia ou meio vazia conforme os gostos analiticos. Prometia animação extra a hora das vassouras entrarem em acção.

Uma breve nota para explicar aos menos familiarizados nestas coisas, que a hora das vassouras nas discotecas de Maputo é aquele momento final em que os barmans já arrumaram as garrafas e recusam servir o copo pró caminho, os porteiros dormem na cadeira, o DJ recoloca pela vigessima vez o mesmo CD, mas mesmo assim voyers, caçadores, caçadoras e fauna bravia, não arredam pé da pista na esperança genuína de a noite não acabar com um regresso a casa a seco. E um ritual de puro engate, que nada a ficar a perder para as cenas habituais nos cabares da Rua Araujo, carregado de emoções fortes principalmente para quem observa de fora. Que normalmente é quem acaba por carregar com o lixo que ninguem mais quer.

Mas esta cronica de maus costumes tem uma personagem como todas as cronicas. Centremos pois as atencoes no nosso heroi anonimo.
Sob o efeito pouco menos que explosivo de meia duzia de Red Bulls misturados com duplos de JB importado de Beirute, posicionou-se num dos locais de visibilidade mais ampla, uns metros bem acima da sala principal. Durante alguns minutos foi obrigado a um exercicio de habituação visual aos flashes, luzes psicadélicas e raios laser, tambem muito por obra e graça da elevada taxa de alcool que lhe corria e corruía o sangue.

Com a visão o menos turva que era possivel dadas as atenuantes, iniciou o exercicio habitual de localizar uma possivel vitima para partilhar as alegrias esfuziantes do final da noite e se possivel as agruras da babaláza no final da manhã. Para isso usava um truque absolutamente inovador de acordo com a sua precepção própria de modernidade. Começava por analisar toda a planicie e áreas limitrofes. Pista de dança, palco, perimetro do balção e cantos menos escuros. Onde visualmente existisse mais carne á vista por m2, seria a sua área restrita de caça. Uma especie de reserva exclusiva ou de forma mais crua, o dumbanengue.

Os factores combinados, pouca roupa muita carne, indiciava a partida um menor risco de insussesso nesta complicada tarefa de caçar em terrenos tão férteis quanto cheios de inusitadas surpresas.
Com as coordenadas da área de envolvimento bem defenidas, faria a aproximação em circulos cada vez mais fechados até ficar de frente com a vitima que teria obrigatoriamente de cumprir todos os requesitos pré-programados. Ou, talvez nem todos. Alguns seriam suficientes. Ou, diremos nós que ninguem nos lê muito menos ele, desde que fosse aproximadamente fêmea, esperancada nuns carinhos mesmo que apressados e um pequeno almoco trivial, atendendo as circunstancias e o andiantado da hora, sairia dali com o destino imediato já traçado. A sua flat, castelo onde os castigos finais normalmente eram infligidos.

Alguns minutos de cuidada observação aerea do terreno, foi suficiente para focar e sinalizar um pequeno grupo de quatro ou cinco gazelas multicolores cujo denominador comum coincidia exactamente com os parametros exigidos a si mesmo para esta ocasiao. Pouca roupa mas de cores espampanantes, muita carne á vista tanto nos membros inferiores como nos dorsos, tissagens e extencoes para todos os gostos e cores e, sobretudo, uma evidente excitacao de corpos que se marrabentavam entre si na busca de contactos fisicos a pedirem urgência de muito mais transpiração que aquela proporcionada pelo ritmo da musica.
Estava ali o quadro perfeito e preferencial da sua programada investida naquela planicie muito frequentada por diversos tipos e raças de caçadores e presas, mas raramente trabalhada a preceito por experts do seu gabarito.

....continua.... em breve....

Sem titulo


No "umamoratrevido" encontrei esta pérola. Mesmo sabendo que os direitos de autor são reservados não resisti.

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Nunca me deixaram antes, sabes, fui eu sempre que fugi, trancas à porta, adeus que se faz tarde. Nunca me esqueceram primeiro nem nunca amei quem não me amou. Não é presunção, é questão de me fazer todo o sentido: o Amor é um encontro de vontades no espaço sideral, é um nó que flutua, solto, mas que não se desfaz enquanto as duas pontas não se desentrelaçarem em simultâneo. Como poderia amar-te se tu não me amasses de volta? Como poderia amar-te sem conhecer, compreender e aceitar os termos do teu Amor? Se apenas eu te quisesse, o meu querer seria a ponta solta de um cabo eléctrico à deriva numa poça de água, sem rumo, apenas à procura de fazer doer a alguém. Por isso acho estranho, continuar a chorar às escondidas por ti, quando, supostamente e de acordo com todas as regras do bom-senso e da boa vida, tu já nem te lembras que existo. Que sentido faria, encolher-me os joelhos como uma miúda acossada pelos mais velhos e remeter-me, triste, o rosto entre mãos, para o canto do recreio, se tu não recordasses ainda os traços que me compõem o rosto? Seguro de que não te amaria, se não viesses igualmente ao meu encontro, se não corresses algures na minha direcção. Nunca poderia ter continuado a dar-te colo, se me tivesses virado as costas, nunca poderia amar-te as costas, o teu encolher de ombros, esse gingar de ancas desacauteladas. Não entendes? Tens de estar à minha volta, a rondar-me a teimosia, para que eu ainda me lembre de ti. Tens de, por vezes (só por vezes, é o que basta), dormir comigo e de me fingires tua companhia ao almoço, para eu ainda te ter tanto carinho. Tenho de continuar presente na vontade das tuas mãos, na ponta dos teus dedos. Se eu ainda te amo é porque nos encontramos com frequência a meio caminho um do outro, sobre um lago gelado,um campo de trigo, uma estrada deserta. Ou no reflexo de uma chávena de café, no períneo da cidade morta.

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