26.5.09

Diálogos Prováveis (parte I)




Diálogos Prováveis na Noite de Maputo



Vestiu-se de forma a evidenciar os atributos fisícos que sabia ainda manter intactos. Saíu de casa naquele sabado á noite, disposta a recomeçar a viver. Seis meses de clausúra eram já mais que suficiente para cumprir o luto pelo fim de uma relação fracassada de seis anos. Juntou-se a um grupo de amigas e nessa noite beberia o suficiente para se desinibir, divertir-se e possívelmente acabar a noite nos braços de alguem.
Depois do jantar num dos restaurantes da moda e das habituais discussões acerca do local onde terminar a noite, decidiram-se pela discoteca mais famosa da cidade. O ambiente era demasiado jovem para ela e a música não lhe agradou de inicio mas acabou por ignorar os pormenores e cumprir aquilo que tinha planeado. Divertir-se e esquecer. Dançou durante duas horas seguidas, riu bastante e a meio da noite descobriu um olhar masculino e provocador que a perseguia pela pista de dança. Estava cumprida parte da noite e era chegada a altura de passar á ultima fase.
Pelos sinais que se recordava e que eram usados universalmente pela fauna urbana da noite, convidou-o com o olhar a aproximar-se dela. Durante alguns segundos fixou-lhe os olhos negros e rebeldes usando um olhar insinuante e sorrisso fingidamente candido. Ele, respondeu com um sorriso cumplice mas permaneceu de pé, encostado ao balcão de forma provocadoramente desinteressada. Ela ficou embaraçada e por alguns instantes desviou o olhar. No meio daquela turba onde predominavam jovens femeas predadoras, aquele era sem dúvida um dos troféus mais apetecidos mas sentia-se capaz de o levar para casa.
A aparente timidez dele obrigou-a a mudar de estratégia. Disfarçadamente desceu o decote da blusa e encheu o peito. Olhou-o desafiadoramente de frente e levantou-se. Agarrou o copo e atravessou a sala repleta de gente frenética que abanava os corpos ao som da música e sem nunca deixar de o olhar nos olhos, aproximou-se. Visto de perto era ainda mais interessante. Jeans de marca e camisa preta. Pele morena clara, olhos escuros e lábios sensualmente grossos. O cabelo castanho claro ondulado e prepositadamente despenteado, dava-lhe um ar de menino rebelde apesar de evidenciar que já passara dos trinta.
- Boa noite. Aqui está um barulho infernal . Trocas por momentos o conforto do balcão e acompanhas-me ao jardim para podermos conversar um pouco enquanto acabamos as nossas bebidas?
- Porque não? – respondeu ele.
Ela pegou-lhe na mão e arrastou-o atrás de si enquanto abria caminho. Transpôs a porta de acesso ao jardim, ladeou a piscina e escolheu uma mesa no fundo meio escondida entre palmeiras, onde o som da pista de dança chegava com pouca intensidade e permitia dialogar.
- O meu nome é Sofia. Sou divorciada à poucos meses e não saio de casa para locais como este á cerca de dois anos. Devo ter perdido o ritmo pois tanta gente junta confunde-me. Tú és um homem demasiado bonito para estares neste local sózinho. Que se passa?
- Obrigado pelo elogio. Tambem és muito bonita e sexy. Chamo-me Carlos. Tenho uma filha de 3 anos e vivo só. Fui casado mas descobri outros caminhos e tambem me divorciei.
- Outros caminhos? Que significa isso?
- Provávelmente vou-te desiludir mas... descobri que afinal o que gosto verdadeiramente é de homens. Sou gay, portanto...


21.5.09

Opções


Por norma encanto-me fácilmente com as pessoas num primeiro contacto mesmo que breve. Salvo em raras e importantes situações, tambem por norma desencanto-me naturalmente ao fim de algum tempo. Esta reconhecida incapacidade de consolidar o portfólio de amizades duráveis, coloca-me por esta altura num dilema existencial. Desde que te conheci que não me sais da almofada. E, ou te mantenho aí e sei que vais durar, ou te meto nos debaixo lençois como claramente pretendes e aí sei, vai começar a contagem decrescente.

Dúvidas deste género à uns poucos anos atrás nem se colocavam. Era caminho directo para a fogueira seguido de uns quantos dramas de alcofa inevitáveis e um afastamento natural e irreversível. De tantas vezes ver o filme até já os nomes dos duplos conheço.
Nesta altura da vida, ou o barómetro que rege as opções anda avariado ou fiquei adulto antes de tempo.

20.5.09

As mulheres são o que são!



Não resisto a transcrever daqui. Com uma respeitosa vénia!

As mulheres trocam tudo. Especialmente trocam quando desligam o coração do corpo: impossível cirurgia. Porque a fazem? Querem um amor livre de sofrimento como um iogurte livre de açúcar? Não há. Vão para a cama com um homem, têm um orgasmo e acham que se apaixonaram. Se têm o azar de ser sexualmente compatíveis com esse homem, porque as anteriores experiências do sexo os deixaram a ambos no mesmo patamar performativo, acham que amam, que é a mística da pele ou as feromonas ou outra merda qualquer sentimental e zoológica. Se a isto se junta alguma proximidade de referentes académicos e sociais é, seria se eles deixassem, a predestinação, como não deixam, o drama de ter e perder! Viram a luz, pela vigésima vez, mas já esqueceram as outras dezanove... Os homens têm, no sexo como na linguagem, um coração mais escorreito, menos rasteiro. Andam mais próximo da verdade. Sexo é sexo. É desejo e posse todo o tempo em que o desejo de posse durar. Se é bom, melhor, demora mais do a ao z. Mas não lhe chamam amor por causa disso. Claro que todo aquele maluquedo de serem o senhor irresistível número x/2009 os envaidece. Isto é um desencontro horrível: elas engolem dicionários à procura do brilho da palavra que, enquanto os ofusque, as enalteça, eles andam à procura do primeiro, tão simples, "gosto de ti". Em tudo o que é genuíno, do amor à arte, há, não a elaboração, mas o despojamento da carne em espírito vivo.


12.5.09

Marcas de Guerra


Prisioneiro das teias que tecemos, interrogo o tempo que passou e não te apaga. Ès um peso que carrego, leve e agradável em alguns poucos momentos, insuportável e agreste quase sempre, em especial quando invades sem convite as minhas carências afectivas. E eu que tanto lutei para seres apenas mais uma indolor cicatriz de guerra, começo a equacionar a possibilidade de ter de recorrer a uma qualquer dessas modernas cirurgias experimentais para te remover definitivamente de mim.