28.10.06

Amanha quero acordar assim!

Maria Teresa Horta

Sem ti

Não quero viver sem ti
mais nenhum tempo.

Nem sequer um segundo

do teu sono.

Encostar-me toda a ti

eu não invento.

Tu és a minha vida o tempo todo

Hoje adormeço assim!!!

Zélia Duncan

Não tem volta

Se você vai por muito tempo
você nunca volta.
Você retorna,
você contorna
mas não tem volta
a estrada te sopra pro alto
pra outro lado
enquanto
aquele tempo
vai mudando.
Aí, de quando
em quando você lembra
aquele beijo,
aquele medomas
você sabe
que tudo ficou antigo
e você não volta
nem com escolta
nem amarrado
porque o passado
já te perdeu
e o perigo
muda mesmo de endereço.
Não existe pretexto.
O dia mudou
o carteiro não veio
o principio é o meio
e você retorna
mas não tem volta.

Hoje acordei assim!

Florbela Espanca

Se tu viesses ver-me...


Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...

Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...

Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...

20.10.06

Tarde demais!



"Por vezes dizemos as coisas tarde demais. Lembramo-nos do que poderíamos ter dito ao outro quando o perdemos ou quando estamos prestes a perdê-lo. Porque nos custa tanto dizer o que podemos dizer no tempo certo?"

19.10.06

Vazio...


Paixão, ainda és a minha princesa e vou continuar a sentir a falta. Principalmente daquilo que sentia quando estava contigo. A serenidade absoluta. A certeza do que queria e do que era dispensável. Parece cola daquela transparente que se vende em tubinhos tamanho miniatura. Não te consigo arrancar daqui. Falta-me quase tudo em mim desde que me desisti de te procurar. Falta-me o cheiro, o riso, a lucidêz. As memórias de ti têm cores e sons e afagos de carinho impossíveis até agora de sentir com mais alguem. A vontade irreprimível de te escrever. Os sentidos ao rubro acesos pelas tuas mãos na minha pele. Os doces minutos pós-sexo que quase sempre terminavam no recomeço. A viagem de regresso que era apenas o inicio da próxima. As ultimas horas antes de cada encontro eram já esse encontro e as seguintes eram a planificação de um outro. Porque sabes, nós nunca terminavamos nada. Tudo tinha continuidade. Nunca me habituei a ter alguem tão perto que me sentisse sem ar para respirar. Sempre desejei amar á distancia certa, o que que significa apenas que troco fácilmente duas ou três horas de compensadora intimidade a dois, por uma noite inteira a dormir e acordar agarrado a alguem. Hoje sinto a tua falta nesta solidão mal acompanhada e pior resolvida. Não sei sinceramente se é de ti que sinto falta ou de mim quando te tinha. Sei que sinto falta.

16.10.06

Liberdade!


Porque me parece MUITO importante e actual, transcrevo este artigo publicado no JN de Portugal e que a minha atenta amiga Maria http://romadevidro.blogspot.com/ enviou!!
Para se ser livre é preciso coragem, muita coragem. E, desde logo, coragem para uma escolha fundamental, a do respeito por si mesmo. Porque é bem mais fácil sobreviver acobardando-se do que escolher viver livremente. Os locais de trabalho, a vida política, a mera existência social, estão (basta olhar em volta) cheios de cobardes de sucesso. O jornalismo não é, e porque haveria de ser?, excepção, pois a pusilanimidade e a cumplicidade dão menos incómodos e rendem mais que a dignidade. Mas, enquanto na vida politica e social, o preço da liberdade é a solidão (as águias, como Nietzsche escreve, voam solitárias; os corvos andam e grasnam em bandos), no jornalismo o preço é às vezes a própria vida. Anna Politkovskaya escolheu a liberdade e pagou com a vida.

Mas a Rússia é um lugar longínquo e entre nós não se dão tiros na nuca a jornalistas, na pior das hipóteses despedem-se. É, por isso, fácil chorar por Anna Polit-kovs-kaya, basta só um pouco de falta de pudor. Assim, os jornais portugueses (e do mundo inteiro, acrescentamos nós) encheram-se nos últimos dias de grasnidos e lágrimas de crocodilo vertidas por gente que, na sua própria vida profissional, escolhe o salário do medo. Alguns conheço-os eu e, como no soneto de Arvers, hão-de ler-me e perguntar "De quem falará ele?".
Manuel António Pina
In: J. N. 2006.10.10

6.10.06

A verdade (copy paste)


Pensara em dizer-lho um milhão de vezes; a vontade de lhe vomitar em cima o que acontecera naquela noite, assaltava-o nos momentos mais estranhos: enquanto ela lia uma revista sentada na sanita, cortava as unhas dos pés ou pintava as das mãos, ou enquanto desembaraçava o cabelo em frente ao espelho. Era como se a insignificância dos rituais diários dela pudesse, de alguma forma, tornar pequeno e de somenos aquilo que ele lhe queria revelar, como se fosse algo igualmente mecânico e descartável, venha daí outra coisa qualquer e sigamos para bingo.
Uma vez, pensara em dizer-lho enquanto ela se depilava numa operação demorada de cera a frio. Olhava-a, febril (ela, concentrada que estava naquele timing perfeito do espalha-arranca), antevendo o momento em que lhe despejaria em cima o seu balde de revelações sujas, qual porteira distraída. O que ele não supunha era que ela, careca de saber da angústia culposa que lhe roía as noites, se concentrava sempre um bocadinho mais nas unhas, nos pés, nos cabelos e se mostrava totalmente indisponível para a abébia que ele queria que ela lhe desse. Se entrava na casa de banho, ela saía de rajada em busca de um creme esquecido e, se se sentava ao seu lado na cama, a ela, assomava-lhe um sono súbito que lhe toldava a percepção. Outras vezes, quando ele estava quase, quase, lembras-te daquela noite em que eu..., ela atalhava, ceifando-lhe as palavras tossidas por entre suores frios, passas-me o papel higiénico, por favor?, ao que se seguia uma reflexão sobre a pasta de papel e o seu peso nas indústrias poluidoras. E ele lá ia adiando a confissão, adiando uma e outra vez, aquele menir que lhe esmagava o esterno sem quase o deixar respirar.
A hipótese de não lho dizer de todo nunca se colocara, pois ele era daqueles que cultivava a verdade a qualquer custo, que a mimava e alimentava como a uma filha ou a uma planta, gerada que fora no seio dos pergaminhos familiares. Assapado no totalitarismo do conceito de verdade como sendo algo de absoluto e válido por si só, escapou-lhe a evidência: de que a dita também pode correr subterrânea, como um lençol freático que segue manso e não deve vir ao de cima nem, muito menos, jorrar tipo geiser, sob pena de inundação diluviana dos sentimentos e de todos os seus anexos. Não intuiu, ele, que alturas há em que a verdade, para o ser, basta ser pressentida, sem precisão de se exibir nua num striptease de perna aberta à volta de um varão, em exposição pornográfica e a arfar sobre os clientes os seus sonhos distantes; e provou assim desconhecer o poder de devastação nuclear de uma verdade que se queria calada - um poder, destruidor não apenas dela própria, mas também de todas as outras verdades que a vida deles transportava em compartimentos interiores e malas de viagem e que, num segundo, se desfizeram em poeira atómica.
Ela tentou dizer-lho: a cada vez que desatava a discorrer sobre o peso do papel higiénico no meio ambiente ela estava a avisá-lo, a enviar-lhe sinais para que guardasse as palavras bem embrulhadinhas dentro dele, para que as dobrasse em quatro, depois em oito e por fim em dezasseis, para que fizesse com elas um quantos queres, um avião, um barquinho ou uma bola de cuspo, e as atirasse ao ar ou lhes puxasse fogo, que ela não as queria. Só que, quanto mais ela fugia, mais ele corria atrás dela, desalmado, a desfraldar-lhe a história daquela noite em estandarte, um vozeirão épico de valquíria a querer sair-lhe do peito e ela sempre a tapar os ouvidos, lailaraiquenãoqueronemsaber.
Que burro fora, ele. Sempre com a boca cheia de verdade, para aqui e para acolá: sobrevalorização nítida. Falta de senso. De sentido das proporções. De instinto de sobrevivência amoroso. Não teriam sido as fugas dela mais do que suficientes para o redimir? Não poderia ele ter visto, na mímica perfeita do silêncio dela (um silêncio atulhado de futilidades) o perdão e a fuga em frente, o beijo do esquecimento, a passagem secreta para os dias seguintes? Poderia... mas não o fez.
Um dia, enquanto ela se secava à pressa de um duche tardio, ele cercou-a e disparou sem dó nem piedade, lembras-te daquela noite em que eu... E ela, apanhada de surpresa entre a água que lhe escorria e a procura dos chinelos de quarto, não foi a tempo de sacar assunto e viu-se obrigada a engolir a verdade com todos os acompanhamentos, batata frita, arroz e salada, uma anoréctica forçada ao alimento. Uma verdade de merda, diga-se: estúpida, como tudo o que é fortuito, e inútil, como tudo o que nada significa de facto.
Pôs-lhe as malas à porta e nunca mais se viram.
Epílogo.
Ele sentiu-se culpado, mas nunca percebeu que o crime maior que praticara não fora o da traição mas sim o da soberba, ao arrogar-se uma superioridade moral sobre ela (que não detinha): ele contara-lhe a verdade daquela noite vazia, não porque achasse que ela merecia sabê-la, mas por uma questão de princípio; não porque a respeitasse acima de todas as coisas, mas porque não se podia permitir perder o respeito que sentia por si próprio.
Ela, por sua vez, não desarvorou em fúrias de mulher enganada nem em gritarias de culebrón (coisa que nem lhe faria o género); passou, apenas, a olhá-lo como o que ele realmente fora: um idiota perdulário, um pobre esbanjador, que deitara fora tanto por tão pouco. No fundo, limitou-se a achar que ele (não fora aquela rectidão transpirada por todos os seus poros, sempre tão honestos e verticais), poderia mas era ter enfiado a puta da verdade em vários outros sítios, que não entre eles os dois. Básicamente.
Copiado de um texto anónimo recebido por email



5.10.06

A Paz!


Ontem foi o nosso dia da paz... No espirito globalizante dos tempos modernos impressionou-me este texto que retiro do Mulheres e Deusas (link na direita) e que fala exactamente da paz que não sabemos preservar e do caminho que estamos a percorrer como humanidade.

“Como é que, só no século vinte, os seres humanos tenham morto para cima de 100 milhões dos seus semelhantes humanos? Seres humanos a inflingirem a outros sofrimento de tal magnitude ultrapassa tudo o que possas imaginar. E isso sem levar em conta a violência mental, emocional e física, a tortura, a dor e a crueldade que eles continuam a infligir-se uns aos outrs assim como a outros seres viventes numa base diária.

Agem desta maneira por estarem em contacto com o seu estado natural, a alegria da vida interior? Claro que não. Só pessoas que estejam em estado profundamente negativo, que se sintam muito mal, criariam semelhante realidade como reflexo do que sentem. Agora estão empenhadas na destruição da Natureza e do Planeta que as sustenta. Inacreditável, mas verdade. A espécie humana está perigosamente louca e muito doente.” (...)

In “O PODER DO AGORA” de Eckhart Tolle

A Outra Margem


Uns anos atrás, amigos mais chegados, martelavam-me na cabeça sempre que me viam acompanhado por uma nova mulher. Embirravam solenemente com a facilidade com que dava corda a qualquer uma que fosse capaz de debater ou mesmo apenas concordar acerca de qualquer tema menos fútil, mais que quinze minutos sem perguntar se era casado, comprometido ou solteiro. Sempre preferi a companhia de mulheres á dos homens e por essa razão buscava incessantemente na alma femenina a inteligência capaz de me adomar a um sofá á volta de um livro ou a uma cadeira de cinema ou teatro e partilhar assim uma mesma visão que no final daria umas horas de compensador debate intelectual muitas vezes como aquecimento para a inevitável, ou não, contenda fisíca.

A natural quebra das convicções marialvas e donjuaninas, o que traduzido de forma clara quer dizer a idade, acabou arrefecendo este afã de viajante e explorador. Agora contento-me em buscar almas tão perdidas quanto a minha e por isso mais capazes de entender aquilo que nem eu sou capaz de perceber.

No acesso a cada mulher existe sempre como que um rio que tem de se transpôr. Da corrente desse rio depende a facilidade de chegar até lá ou mesmo o grau de desafio que representa a intenção. Já lutei com grandiosas ondas e já fui levado simplesmente ao colo. Claro que algumas vezes desisti mesmo antes de começar e em muitos casos afoguei-me. Ás vezes com a margem á vista.

Vem esta prosa divagante e molhada, a propósito de uma prespectiva de afogamento que se avizinha. A corrente altera-se a cada maré e transporta em cada enchente um sem numero de escolhos que impedem um percurso na direção correta. A força das vagas tem-me empurrado em cada tentativa para o ponto de partida. Presistentemente atiro-me de novo ao charco e, olhos e mente no objectivo, luto contra as ondas e a corrente. Em vão até agora. Acabo sempre esfalfado e esgotado na mesma praia.
Da outra margem chegam palavras de incentivo que ainda não produziram os efeitos desejados apesar da sincerdade. O unico efeito claro é o de me obrigarem sempre a retomar a luta e prometer mim mesmo a cada dia não desistir na esperança de uma bonança que permita chegar lá mas as forças começam a faltar.
Para terminar onde iniciei, falta apenas afirmar que aqueles que á uns anos quase me batiam de cada novo investimento, são agora aqueles que me oferecem colete salva-vidas e incentivam a atirar-me de cabeça para a outra margem. Vá lá um homem entender os amigos.